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RAZÃO SUPÉRFULA

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  • Foto do escritor: Américo Júnior
    Américo Júnior
  • 21 de ago. de 2024

Ontem um pequeno besouro me ensinou uma lição. Sim, um pequeno animal irracional (creio que chegado ao mundo há pouco tempo), ensinou um bípede da espécie humana (a qual se julga superior ao restante da natureza e acredita ter o direito de explorá-la, de escravizá-la em função de seus desejos) a olhar, com um pouco mais de atenção, ao seu redor. Esse evento me fez pensar muito sobre o que seria ensinar e sobre nossa relação com o tempo. E acredito, firmemente, que ambos estão interligados.


Mas antes de falar sobre isso vou pedir ajuda a meu amigo Henry Bergson! 


Ele já não vive mais entre nós, mas me ensina bastante. Os mortos podem nos ensinar, tanto quanto os vivos, e isso também ajuda a pensar muito sobre o que seria ensinar. 


Bergson pensa o ser vivo, na sua materialidade, como um constante transmissor de movimento no plano da natureza. E a natureza é entendida como um conjunto de imagens móveis  que agem e reagem umas sobre as outras em todas as faces e em todas as direções. Nessa perspectiva, os corpos são imagens que exercem influência sobre os outros corpos (ou seja, outras imagens), através de estimulações sensíveis. 


Nessas interações os corpos se estimulam. Para um determinado estímulo, um corpo não vivo irá produzir uma resposta automática. Se for um corpo vivo, este produzirá uma resposta criativa. 


O corpo vivo parece escolher, em certa medida, a maneira de devolver o que recebe. O processo de escolha supõe uma hesitação e toda hesitação demanda um intervalo de tempo. Há, portanto, um intervalo de tempo entre a recepção do estímulo e a resposta que o corpo produz. A esse intervalo Bergson vai dar o nome de subjetividade. E esse intervalo é constituído por uma indeterminação, ou seja, a resposta criativa não está prevista no estímulo recebido. 


Voltamos então ao ensinar, o qual é muito diferente de apenas transmitir conhecimento. 


Estava varrendo o chão da casa quando me dei conta que, junto com a poeira que tirava do chão, havia um pequeno besouro. Minha atitude foi de catá-lo e colocá-lo em um ambiente que não lhe fosse hostil. Quando o peguei, ele encolheu todo o seu corpo dentro do seu casco. Foi a forma como ele interagiu comigo, protegendo sua vida. Resposta a um estímulo. Maneira que esse ser criou para preservar sua vida nessa situação que parecia lhe pôr em perigo. No entanto, seu recolhimento também foi um estímulo para mim. E desse estímulo surgiu esse texto. Resposta criativa após um intervalo de tempo. 


Só podemos ensinar a seres que respondem criativamente aos estímulos. Aos que respondem de forma automática, chamamos esse processo de condicionamento. 


Ensinar tem a ver com ampliar as possibilidades de um corpo sentir e perceber o mundo ao seu redor, para que esse corpo consiga perceber a si mesmo nessa complexidade de relações estimulantes entre corpos que é o mundo. Mas para que, também, esse corpo consiga construir as suas próprias maneiras de responder criativamente aos estímulos que lhe tocam. Para que possa caminhar por si próprio e estimular os outros corpos com responsabilidade.


Mas o mais maravilhoso, é que dentro dessa perspectiva qualquer corpo pode nos ensinar algo. Porque ensinar vai muito além do sentimento egoísta, que é ver o outro provando que tem conhecimento sobre informações que julgamos essenciais à sua vida. E que isso aconteceu por nossa causa. As informações são importantes, é claro, mas o que importa é o que cria um corpo diante disso. Daí se consolida seu saber. Caso contrário, são meras respostas automáticas.


E para que haja criação é preciso tempo. Tempo para perceber as relações entre as coisas, para observar os detalhes, as miudezas e deixar maturar uma forma própria de se exprimir no mundo. Ensinar tem a ver com agir para a produção de subjetividades, para produzir memória, ao contrário de condicionar a memorização de informações.


Essa abertura à indeterminação, que é necessária para que a subjetividade se constitua, está sendo cada vez mais minada pelos dispositivos que abundam ao nosso redor. Estamos sendo hiperestimulados de forma cada vez mais frequente e contínua. 


Essa é uma marca do atual momento histórico que vivemos. A dominação dos corpos está ligada à controlar o tempo, impingir um ritmo à subjetividade, eliminar o intervalo temporal existente entre o momento de perceber e o momento de agir, subtraindo do indivíduo a indeterminação indispensável para que ele possa agir criativamente


E com o cada vez maior número de estímulos a que somos submetidos, fica cada vez mais difícil agir criativamente como resposta. Temos pouca paciência e energia para elaborar nossos pensamentos, para lidar com o tempo, para esperar que nossas ações amadureçam e ganhem corpo. E, contraditoriamente, talvez nunca quisemos tanto realizar tantas coisas como queremos hoje.  


Um outro amigo, pedagogo, chamado Jorge Larrosa, ao falar sobre a experiência, afirma que a experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço.


Se não deixamos que algo nos aconteça, acabamos por automatizar nossas relações. Não paramos para pensar no que fazemos, não construímos posições próprias, viramos seguidores. 


É importante parar um pouco; cogitar um modo de vida com menos estímulos; poder ter momentos para entrar no casco, como o besouro, e deixar o caldo estimulante fermentar um pouco; se concentrar em uma única atividade por vez. Não apenas para se proteger desse fluxo violento de ações e informações que vez ou outra nos derrubam, mas para que daí possa emergir ações concretas, singulares e não mais reprodução de um mesmo que já se provou incapaz de transformar a atual ordem das coisas.


  • Foto do escritor: Américo Júnior
    Américo Júnior
  • 8 de ago. de 2024

Quanto mais olho pra fora

Menos enxergo ao redor

Quanto mais estou ao redor

Mais me percebo 


Quanto mais coisas faço

Menos consigo fazer

Quanto mais sou fazer

Mais me transformo 


Quanto mais quero rapidez

Menos vejo os detalhes

Quanto mais sou detalhes

Mais o mundo aumenta


Quanto mais me informo

Menos conheço

Quanto mais conheço

Mais me encanto


Quanto mais busco segurança

Menos encontro liberdade

Quanto mais em liberdade

Mais cuido de mim


Quanto mais procuro espelhos

Menos me vejo

Quanto mais me vejo

Mais posso estar com os outros


Quanto mais grito

Menos escuto meu próprio som

Quanto mais escuto o meu som

Mais danço 


Quanto mais estou conectado

Menos faço conexões

Quanto mais faço conexões

Mais me descubro


Quanto mais tenho conforto

Menos me movimento

Quanto mais sou movimento

Mais estou vivo


Quanto mais tenho medo

Menos me arrisco

Quanto mais me arrisco

Mais a vida é uma aventura


  • Foto do escritor: Américo Júnior
    Américo Júnior
  • 7 de ago. de 2024

Ultimamente tenho pensado muito em organizar algumas ideias na forma escrita. Na verdade, até tenho alguns textos escritos, mas se encontram friamente escondidos em arquivos digitais, os quais, só acabo por acessar num daqueles raros momentos em que paramos para olhar os rastros que deixamos no mundo.


No entanto, reside em mim uma vontade de ser lido. Na verdade, de ser lido em determinado contexto. Não porque eu acho que aquilo que penso seja de suma importância para o mundo. Até andei escrevendo umas baboseiras no instagram quando utilizava essa rede social, mas escrever ali me gerava uma série de incômodos, porque essa rede não foi desenhada para a produção de textos.


De forma geral, quem acessa o instagram está lidando com propagandas, seja de pessoas jurídicas ou pessoas físicas. Ali é um espaço publicitário por excelência, e a publicidade é um elo entre um consumidor e um produto, seja esse produto um objeto, uma ideia ou um modo de vida. Por esse motivo, é importante pensar que essa dinâmica das redes sociais acaba por ser bastante influente na maneira como nos relacionamos com nossas próprias vidas.


Ao rolarmos nossa timeline, paramos muito pouco tempo para visualizar cada foto ou vídeo que nos é apresentado. Nesse sentido, em um pequeno intervalo de tempo, somos submetidos a uma grande quantidade de estímulos visuais e sonoros. Por esse motivo, a dinâmica da comunicação social nos induz a buscar vídeos cada vez mais curtos e textos cada vez menores, acelerando a entrega da mensagem à custa da supressão das nuances e de qualquer elaboração estética. 


De acordo com o professor Auterives Maciel, está cada vez mais raro a vivência de “experimentações sensoriais que nos retirem do âmbito dos hábitos consolidados pelos interesses práticos, que condicionam automatismos puramente interesseiros e comprometidos com uma inteligência viciada em representações que são verdadeiros clichês – circuitos já trilhados a serviço da recognição da realidade”. Ou seja, enquanto somos entretidos nas redes, estamos aprendendo/ nos condicionando a não nos darmos tempo e espaço para deixar que nossos corpos sejam atravessados por estímulos mais demorados e complexos.


Mas você pode pensar: diante disso, qual o sentido de escrever textos em um blog? Ninguém vai ler!


Bom, certamente você tem razão. No entanto, se, por acaso, ao percorrer essas linhas você, de alguma forma, sentiu algum interesse por pensar no que está escrito, se desejou, por si mesmo(a), fazer da leitura um ponto de partida para trilhar algum caminho de pensamento e ação, posso dizer que o propósito do que resolvi começar a fazer se concretizou.


Quero escrever para produzir acontecimentos. Em mim mesmo, ao buscar ser afetado pelo mundo de outras formas, para que as experiências e os sentidos oriundos dessas experiências me ajudem a construir formas próprias de significar o mundo em palavras. E nos outros, se der a sorte de algum texto atravessar um leitor, gerando prazer ou incômodo, que obrigue esse corpo que lê a produzir algum movimento.


Nesse sentido, esse gesto de escrever pretende ser o transbordamento de um corpo que busca encontrar outros corpos, os quais também se permitem transbordar. Transbordar é derramar-se. Tudo o que derrama, acontece por que aquilo que o continha não tem mais condição de fazê-lo. Portanto, todo transbordamento é, ao mesmo tempo, a construção de novos contornos para o corpo que transborda. Só transbordam os corpos em movimento. E só percebemos as linhas de força que nos limitam quando transbordamos.


Porém, antes de começar a escrever esse texto, coloquei o título deste post no google para ver o que teria como resposta. E, dentre as inúmeras publicações que acessei para ver o que as pessoas pensam sobre esse assunto, em nenhuma delas encontrei um pensamento que se aproxime da perspectiva que estou propondo. Todas as postagens tinham a intenção de convencer o leitor de que ter um blog, nos dias de hoje, é interessante por 5 motivos.


  1. Aumento da visibilidade da sua marca

  2. Baixo custo para iniciar o projeto

  3. Aumento da cartela de clientes e seguidores

  4. Possibilidade de gerar renda com o próprio blog

  5. Fidelização dos clientes 


Vê-se, claramente, que é a perspectiva econômica que mobiliza as pessoas a produzirem a maior parte dos conteúdos que acessamos. Mas não uma lógica econômica qualquer. Um viés econômico que nos condiciona a gastarmos nossa energia apenas quando vislumbramos a obtenção de algum ganho futuro. Interessante pensar que somos condicionados a agir dessa maneira desde muito cedo. Um exemplo são os pais condicionando os seus filhos a fazer determinada coisa mediante uma premiação ou a não serem castigados. Outro exemplo está na escola, quando os alunos só se propõem a realizar alguma atividade mediante a promessa de uma nota para compensar o esforço.


Não estou defendendo, com essa argumentação, que as pessoas não devam ser pagas ou recompensadas pelo serviço que prestam ou pelo esforço que fazem. O que proponho pensar aqui é que reger a vida apenas por essa perspectiva utilitarista é empobrecedor do ponto de vista simbólico. Porque se agimos sempre voltados à obtenção de um ganho ou benefício futuro (seja esse benefício financeiro, político, afetivo, etc), estamos sempre trabalhando na produção de algo. Portanto podemos concluir que alguém que vive nessa perspectiva quase não possui tempo livre.


Na Grécia antiga existia uma palavra que significava tempo livre. É a palavra scholé, da qual deriva a nossa palavra escola. Daí que escola era o local no qual os alunos tinham tempo livre para pensar sobre as coisas do mundo, sobre a vida, sobre os acontecimentos que nos circundam. Ao se depararem com o mundo em sala de aula, eram instigados a criar suas próprias maneiras de ler a realidade. 


Quando pedimos para um aluno escrever um texto sobre determinado assunto, o fazemos para que este possa, progressivamente, aprender a observar as coisas à sua volta, e a organizar sua própria maneira de pensar, em diálogo com outras formas de pensar, as quais encontramos nos livros que lemos. Conhecer mais sobre as coisas do mundo e ser capaz de pensar por si mesmo nos proporciona autonomia para lidar com as contingências, fazendo boas escolhas, tomando as melhores decisões.


Perceba que na perspectiva do tempo livre, aprender não é acumular conteúdos que precisam ser dominados para produzir alguma coisa que nos dê um ganho no futuro. Pelo contrário. Se o tempo é livre, agimos de acordo com nosso desejo. Nesse sentido é a vontade de realizar algo que nos leva a aprender, pois para produzir é preciso buscar conhecer o mundo que nos cerca.


A palavra scholé, em grego, é equivalente à palavra otium em latim. Portanto, o ócio é o tempo livre do trabalho que é realizado para obtenção de algum ganho futuro. Isso não significa que, no ócio, nós não fazemos nada. Significa que o ócio é o tempo em que fazemos as coisas apenas pelo prazer de fazê-las, sem que isso esteja condicionado a nenhuma expectativa futura.


E o que seria a negação do ócio? Em latim escrevemos negotium, que dá origem à palavra negócio. Então quando orientamos nossa vida apenas na perspectiva de ganhos imaginados futuramente, fazemos dela um negócio. Claro que a dimensão de negócio faz parte da vida, mas é importante nos darmos tempo e espaço para vivermos encontros e criações que são desinteressadas, ou seja, momentos em que não tentamos projetar o que deve acontecer para que a vida seja boa. Momentos em que apenas nos encontramos com nosso desejo. E tal encontro só pode acontecer no presente, nunca no futuro.


Portanto, se há de sua parte algum interesse em não se orientar por uma perspectiva utilitarista em relação à vida, talvez aqui pode ser um espaço em que você encontre algum tipo de identificação. De maneira nenhuma busco seguidores. Porque quero me contrapor, não apenas no discurso, mas também no próprio gesto de escrever e publicar, ao modelo econômico que orienta aquilo que é cotidianamente produzido.


Entenda este espaço como se fosse uma praça, um café, ou outro lugar que você tem prazer de ir e passar um tempo, seja conversando com alguém, fazendo outra atividade prazerosa ou apenas pensando na vida. Aqui não é um lugar para ser acompanhado. É um local para vir de vez em quando. Até porque existem muitos outros lugares por aí para serem visitados.


Porque não quero seguidores, vou escrever meus textos à medida que eles transbordarem das minhas experiências. Isso quer dizer que não haverá nenhuma métrica que oriente as postagens. Apenas o compromisso, comigo mesmo, de transformar afetos e imagens mentais em textos. 


Se espero algo, é que esta seja uma paragem que fertilize bons encontros.


Sejam bem vindos!


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OLÁ

Meu nome é Américo Júnior. Sem querer me definir, posso dizer que sou um sonhador. Mas não daqueles que esperam o sonho acontecer, no sentido de quase confundir o sonho com a esperança de mundos impossíveis. 

Sou sonhador, pois imaginar mundos me põe em movimento, importando menos se estes mundos imaginários se concretizarão.

Talvez, por esse motivo, seja um professor apaixonado por ensinar. Leciono Educação Física para turmas de ensino fundamental na rede municipal da cidade de Maricá - RJ.
Outra paixão que nutro é a Filosofia, a qual é tão forte que me fez concluir o mestrado em Filosofia e Ensino no CEFET - RJ.
Também sou fotógrafo, embora nos últimos anos a fotografia não tem ocupado muito espaço nos meus devires criativos.

Mas, talvez, aquilo que mais anima meu corpo seja viajar. Porque só é possível viajar quando não se conhece o destino. Se apenas nos deslocamos quando há garantia de segurança, quando programamos todos os caminhos a serem trilhados e quando existe a certeza de que o objetivo concebido antes de sair de casa será atingido, não há viagem. O que caracteriza uma viagem é a imprevisibilidade. Para viajar é preciso a coragem que nos permite mergulhar no terreno do desconhecido.

Aqui pretendo me manter viajando com a caneta!
Sejam bem vindos!

Caso você tenha algum interesse em trocar ideias sobre os temas aqui tratados ou sobre outras questões, entre em contato. 
Fiz a opção por me desvincular das redes socias digitais. Portanto, tenho apenas meu e-mail como contato.

Obrigado(a)!

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